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O início do mês de novembro é marcado pela celebração dos dias de Todos os Santos e dos Fiéis Defuntos. A tradição portuguesa mantém-se, mas nem sempre essas celebrações são ocasião para, como seria desejável, refletir profundamente sobre o sentido da morte. Já várias pessoas disseram que a sociedade contemporânea eliminou muitos tabus e passou a falar abertamente de questões decisivas e importantes que outrora ocultava, como a sexualidade.

Mas, ao mesmo tempo, passou a tratar como tabu uma questão ainda mais importante e decisiva, verdadeiramente incontornável, que é a do sentido da morte. Torna-se hoje desconfortável falar desse tema em público, como se fosse apenas do domínio da intimidade.

Hoje em dia já não é, pelo menos entre nós, tão frequente a morte precoce, devida a guerras e epidemias. Mas com a morte, a nossa e a dos que nos são próximos, todos seremos confrontados, mais tarde ou mais cedo. Esquecer isso, viver como se a realidade não fosse essa, pode ser a pior das ilusões e a pior das alienações.

A morte poderá deitar por terra todos os sonhos e esforços de construção de uma vida e de um mundo melhores e poderá tornar vãs todas as alegrias terrenas. Seria, por isso, um absurdo se a vida, com todas as suas aspirações de felicidade e toda a sua beleza, acabasse em nada. Ou em simples recordações, que se esvanecem rapidamente. E se assim fosse, de pouco serviriam as habituais palavras de consolo e solidariedade dirigidas aos amigos enlutados.

Os cristãos, a partir da fé na Ressurreição de Jesus, acreditam que cada um de nós também é chamado a ressuscitar com Ele. A morte é, então, uma passagem para a vida em plenitude, cujo prelúdio podemos já experimentar nesta Terra, quando nos amamos e assim nos aproximamos de Deus que é Amor. Encarada nesta perspetiva, a morte deixa de ser um absurdo. E também podem encontrar sentido os sofrimentos dos inocentes, as doenças imprevistas, as injustiças a que não conseguimos pôr remédio. Todas estas realidades se relativizam perante o horizonte da vida eterna.

Não se trata de um consolo ilusório. É também uma responsabilidade. Deus quer que todos se salvem, quer partilhar a sua Vida de plenitude com todos, sem exceção. Mas respeita-nos como seres livres e responsáveis. Por isso, seremos julgados, com justiça e misericórdia, de acordo com o modo como vivemos o amor a Deus e ao próximo. E isso não pode deixar de nos impelir a construir um mundo melhor, mesmo que dele não venhamos a beneficiar pessoalmente. Dizia Chiara Lubich que, no Paraíso, haveremos de habitar aquela casa que construímos nesta Terra.

É a esta luz que deveríamos celebrar os Santos e os Fiéis Defuntos, os que já gozam da vida na sua plenitude junto de Deus e os que, para essa meta, caminham também com a ajuda da nossa oração. Não se trata, pois, apenas de avivar recordações. Nem de ocasiões para cultivar a saudade e a tristeza. Mas antes para dar um testemunho de alegria e esperança que brota da fé na Ressurreição.

Artigo publicado na Revista Cidade Nova